quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Resenha: O Guia do Mochileiro das Galáxias - de Douglas Adams

"Eu acordei hoje achando que ia passar um dia tranquilo, ler um pouco, escovar meu cachorro... São só quatro da tarde e já estou sendo expulso de uma espaçonave extraterrestre a seis anos-luz do que resta da Terra!"



 Uma coisa é evidente sobre Douglas Adams no Guia do Mochileiro das Galáxias: ele é um grande gozador, um tirador de sarro, um zombeteiro, exímio manipulador da arte da sátira, do deboche e tudo o mais. Rega a história a todo momento com piadas sutilmente brilhantes. E o principal alvo de suas piadas é, senão outro, o ser humano.

 O Guia do Mochileiro é o primeiro de uma série de cinco livros, sua história começa com a manhã conturbada de Arthur Dent, o protagonista terráqueo, inglês, e humano (porém aos olhos de muitos seres da galáxia, não mais que um macaco). Ao acordar, uma das primeiras coisas que Arthur enxerga, é um trator amarelo do lado de fora da sua casa, e em meio a ressaca da véspera, tenta se lembrar da coisa importante que o irritou na noite anterior e acabou o levando à bebedeira. Não tarda a recordar que o trator está ali para demolir sua casa, pois o conselho municipal planejou fazer uma via expressa por aquele caminho. 

 Arthur, a princípio, decide deitar na lama frente a sua casa, para impedir que o trator avance, mas seu estranho amigo Ford aparece e o convence a ir com ele ao bar, nesse meio tempo, estabelecendo-se um engraçado acordo de que ninguém derrube a residência na ausência de Arthur.

 No bar, descobrimos que Ford não é terráqueo, mas nativo de um planeta próximo à Betelgeuse (estrela gigante vermelha, também pode se entender por um sol da constelação de Orion). Ao tempo em que estão no bar, a terra recebe a visita de seres chamados Vogons. Seu líder, coincidentemente, anuncia que estão ali para demolir a terra, pois o conselho de planejamento galático decidiu fazer uma via expressa hiperespacial por aquele caminho. Após o aviso, sem titubear, os Vogons destroem o planeta terra. Ford, porém, já sabendo o prognóstico daquele planeta desde a noite anterior, consegue salvar a si e a Arthur, pegando carona na nave Vogon.

"Criatura da Terra, a situação é a seguinte: como você sabe, há dez milhões de anos que administramos o seu planeta para descobrir essa maldita Questão Fundamental."
"Por quê?"
"Não, essa aí já descartamos..."

 Desde o início, se estabelece um arsenal de diálogos cômicos; muitos deles, assim como algumas histórias de outras raças contadas no meio da trama, são uma sutil indireta à raça humana. Tanto sobre o coletivo quanto o individual, ácidas críticas estão sagazmente camufladas em todo o tipo de bobagem bizarra. Fala-se sobre política, filosofia, a evolução, o sentido da vida e do universo, tudo de forma divertida, inusitada, ousada e genial. 

"Se uma porcaria de uma máquina resolve procurar e acha a porcaria da Verdade, como é que fica o nosso emprego? O que adianta a gente passar a noite em claro discutindo se Deus existe ou não pra no dia seguinte essa máquina dizer qual é o número do telefone dele?"

 Este é um livro para fazer pensar enquanto ri, e rir enquanto pensa. De bate-bocas irônicos, saem cale a boca's apaixonantes. De contos bizarros, saem analogias surpreendentes. Embora na trama, naturalmente se espere de Arthur que ele seja promissor, trata-se de um protagonista rodeado por tantos personagens cativantes, que essa cobrança quase não vem à tona. 

"Escute aqui, cara, não pense que a gente é que nem esses retardados que só sabem puxar gatilho,  que nem sabem conversar direito! Eu não ando por aí dando tiros a torto e a direito e depois saio contando vantagem pelos botecos da Galáxia, como muitos policiais que conheço! Eu saio por aí dando tiros a torto e a direito, só que depois morro de arrependimento e conto tudo pra minha namorada!"

 Para estipular um limite de piadas inteligentes nessa obra, talvez só o gerador de improbabilidade infinita... O guia do Mochileiro das Galáxias é um clássico do gênero ficção científica, com algo virtuoso em cada entrelinha e personagens tão encantadores, que até seus defeitos viram traços de carisma.

"Não vai dar certo. Minha mente é tão excepcionalmente grande que uma parte dela vai continuar se preocupando." — Marvin.

 Nesse primeiro livro, a leitura é um tanto crua, mas algo compreensível, vide a época em que foi escrito, e nada que os pontos positivos da obra não possam compensar com louvor.




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